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Mensagens

A mostrar mensagens de 2006

Bolha de Sabão

Somos bolhas de sabão. Somos todos bolhas de sabão, que voam aleatórias pelo ensejo do destino. Feitas por Deus, o amigo imaginário dos adultos. Esse amigo imaginário que explica o que não tem explicação e que nos cria a ilusão de conforto quando o destino se nos afigura sombrio. Bolhas de sabão. Voam aleatoriamente chocado umas com as outras, aproximando-se, repelindo-se… Umas chocam e rebentam… Outras chocam, resistem, afastam-se… e depois rebentam. Outras chocam, fundem-se, e depois rebentam. Somos todos bolhas de sabão. Voamos aleatoriamente. Rebentamos. E neste voo aleatório criamos a ilusão de que podemos controlar a trajectória. Criamos a ilusão de que podemos cobrir a nossa bolha transparente com cores opacas. Mas as cores são apenas o reflexo do Sol. Nós criamos a ilusão. Deus tem um sentido de humor muito peculiar. Cria as bolhas e depois fá-las rebentar. Diverte-se deixando que as bolhas de sabão voem numa entropia, pululando entre emoções, desejos e projectos… Mas t...

Pedaço de História

Às minhas avós À avó Rosa Subi a rua a correr. Sentia os sapatos escorregarem ligeiramente no paralelo molhado. Chovia. A tarde estava a meia-luz, pois o Outono estava de partida e o Inverno começava a instalar-se. Para entrar na casa da avó Rosa bastava levar a mão ao puxador e rodar. Estava sempre destrancada. Entrando, sentia-se o cheiro de madeira antiga, de uma casa igualmente antiga. Sentia-se até, o cheiro da humidade. Era o átrio. Tinha de subir as escadas,.. de madeira oca, barulhenta, forradas com alcatifa encarnada. Atirava a pasta (ainda não havia mochilas, não em Darque, pelo menos) para o cantinho do corredor. Sim, porque a casa da minha avó estava cheia de cantinhos mágicos. Alguns serviam até para eu me esconder ou brincar com a Roseta (a cadela Pequinês com mau feitio…). Na mesa estava uma chávena de leite quente com cevada. Leite de vaca… ordenhado nessa mesma tarde. Trazido pela Alice, até casa da minha avó, num cântaro de inox. Lanchava, comia o pão com...

A Grande Corrida à Felicidade….

Todos os homens, mulheres e crianças, capazes de montar a cavalo, deviam comparecer junto do adro da igreja no dia seguinte, pelas oito da manhã. A corrida à felicidade ia começar. No dia marcado e à hora marcada compareceram todas. A palavra passou de boca para orelha e da orelha para a boca e perseguiu este ciclo até que todos da aldeia e das aldeias vizinhas soubessem o caso que ia dar-se. E todos viram naquela a derradeira oportunidade de agarrarem o que toda a vida perseguiram: a Felicidade! Homens, mulheres e crianças. Ricos, pobres e remediados. Todos compareceram no dia e na hora marcada. Ninguém quis deixar de participar naquela corrida em que todos iam ter direito a conquistar o seu quinhão de felicidade. As regras eram simples. Havia algures, ninguém sabia exactamente onde, uma imensidão de felicidade. Tudo o que tinham a fazer seria cavalgar o mais que pudessem e agarrar o quinhão de felicidade que mais lhes aprouvesse. E havia felicidade de todos os tipos e para todo...

Procura-se um Amigo

Vinícius de Moraes Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimento, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar. Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja de todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objectivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de cria...